Carlos Romero
Jornalista
Lembram-se da polémica gerada a propósito do “Museu das Descobertas”? E da proposta do Bloco de Esquerda para substituir o “Cartão do Cidadão” por “Cartão de Cidadania”? Recordam-se do tempo em que chamar cego a um… cego, ou maneta a quem não tinha uma mão ou um braço, não criava quaisquer problemas? E da estranheza sentida por alguns quando Dilma Rousseff se auto designou “presidenta” do Brasil? Estes são apenas alguns dos muitos casos abordados explícita ou implicitamente no novo livro de Manuel Monteiro (não confundir com o homónimo ex-dirigente do CDS) Sobre o Politicamente Correcto, publicado pela Editora Objectiva.
O tema não é fácil. Mexe com questões tão sensíveis como a igualdade de género, o racismo, a homofobia ou a xenofobia, vividas por grupos mais ou menos fechados de forma intolerante e sectária, com pouca ou nenhuma capacidade de diálogo com os “inimigos”. Manuel Monteiro consegue manter uma saudável equidistância entre os cultores e os críticos do “politicamente correcto”, com base num difícil exercício de equilíbrio e sensatez.
Na base do que se convencionou chamar “politicamente correcto” estão ideias e lutas generosas como as da igualdade entre homens e mulheres, o anti-racismo ou o respeito pelas diferentes orientações sexuais, e Manuel Monteiro não perde uma única oportunidade para se manifestar solidário com essas causas. Mas, do mesmo modo, não deixa de criticar os excessos, as incongruências e, pior do que tudo, as pulsões censórias de muitos dos militantes do “politicamente correcto”.
No limite, pode deduzir-se, da leitura deste excelente trabalho de Manuel Monteiro, que o radicalismo de algumas pessoas e instituições carregadas de boas intenções alimenta a besta racista, homofóbica ou xenófoba, que não perde uma oportunidade para expor o ridículo de algumas propostas “politicamente correctas”, sobretudo ao nível da linguagem. Um exemplo entre muitos: alguém se lembrou que as palavras “todos” e “todas” podiam ser substituídas por “tod@s”, funcionando o símbolo “arroba” como sinalizador simultâneo dos géneros masculino e feminino. Acontece que os géneros masculino e feminino não classificam toda a gente. E alguém se lembrou de uma “solução”: teríamos “todos”, “todas” e… “todes” para quem não se sinta confortável com os dois primeiros. E por aí fora.