A navegação na Internet requer muitos cuidados. Esta cautela não é algo que diz respeito somente às crianças e aos jovens. Ninguém se deve excluir de tomar precauções. Mas é óbvio que os mais novos são muito mais vulneráveis. Daí que seja necessário acompanhá-los nos primeiros passos on-line.
Uma questão prévia impõe que se saiba qual a idade aconselhável para que uma criança possa estar face a um ecrã de computador. Nem todos os especialistas em educação estarão de acordo, mas um dos mais qualificados, o psiquiatra e psicanalista Serge Tisseron afirma, em Manual para pais cujos filhos vêem demasiada televisão (1), “que a questão não é saber em que idade se deve pôr uma criança frente a um computador, mas, antes, em que idade é que ela manifesta o desejo disso”. Seja quando for, “é impor­tante que nunca se deixe uma criança pequena sozinha no computador e que os pais a acompanhem sempre nas suas actividades lúdicas”. Ou seja, diz o estudioso dos efeitos das imagens, “é preferível esperar que seja a própria criança a pedir para ser instalada diante de um teclado. Afinal de contas, pode muito bem crescer sem isso!”
A dúvida sobre a conveniência de instalar um sistema de bloqueamento de Internet em casa surgirá mais tarde. Serge Tisseron previne que, “apesar daquilo que os vendedores dizem, não existe actualmente qualquer sistema de bloqueamento absolu­tamente fiável, nem contra a pornografia nem contra a violência. Os sistemas ou são ineficientes ou pecam por excesso”. No primeiro caso, diz, “a criança encontra inevita­velmente na Internet, mesmo sem as procurar, imagens que os pais nem imaginam que ela possa ver. Por isso, se os pais instalarem um destes sistemas, é indispensável que, ao mesmo tempo, encorajem o filho a falar das coisas chocantes que pode encontrar na Internet”. O segundo inconveniente dos sistemas de bloqueamento, prossegue Tisseron, “não é menor e pode até coexistir com o anterior. Por exemplo, ao bloquear todas as imagens de seios e nádegas, impede a criança de aceder a documentos que a escola lhe pede para procurar, como a estatuária grega ou as pinturas do Renascimento”.
É por isso que “o melhor é ter dois códigos – que devem ser pedidos ao fornecedor de acesso à Internet: um para a criança acompanhada pelo adulto, que dá acesso a tudo, e o outro só para a criança, a quem se deve expli­car, ao mesmo tempo, que isso não a protege totalmente e que ela deve falar de tudo aquilo que a possa chocar. Em suma, a protecção não é uma coisa má, mas não torna o diálogo menos indispensável, muito pelo contrário”.
O diálogo é imprescindível. Serge Tisseron insiste nas suas vantagens neste livro de respostas a questões colocadas por Brigitte Canuel, jornalista da revista Famille et Éducation. Se em vez de diálogo, se preferir espiar às escon­didas os sítios que a criança vai consultar, o resultado será o pior de todos. “Com efeito, isto contribui para criar nela a ideia de que ser adulto é ser fingidor, mentiroso e hipócrita, o que a incita evidentemente a esconder sempre tudo aos pais! De facto, a questão principal é saber até onde os pais devem vigiar o filho e a partir de que momento é melhor dar-lhe confiança”. Trata-se de algo cru­cial, já que “as imagens não são apenas uma fonte de tentações oferecidas aos jovens, são também um meio de controlo proposto aos pais”. Prova disso, recorda, “é a publicidade actualmente feita por várias marcas de elec­trodomésticos a pequenas câmaras que se instalam junto ao berço dos bebés, a fim de se poder observá-los a qual­quer altura a partir do quarto ao lado… ou do outro extremo do mundo graças à Internet”.
As consequências deste acompanhamento parecem óbvias: “Enquanto que as gerações anteriores aprendiam a enganar a vigilância parental a partir dos doze, treze anos, estas novas gerações não o aprenderão muito mais cedo, talvez logo aos dois ou três anos de idade? E os pais, habituados à ilusão de ‘tudo saberem’ do filho, não cederão facilmente ao desejo de o vigiar ainda mais – através de webcams –, na escola, no seu próprio quarto, já adolescente, e até – alguns pais pode­riam ser suficientemente perversos para o imaginar – nos seus primeiros encontros sexuais? Em suma, o que se teme hoje é que os pais cultivem e alimentem a confusão e a indistinção entre eles e os filhos. Porquê? Porque desejaram e acarinharam os filhos, porque o mundo lhes parece repleto de perigos e também porque fabricantes pouco escrupulosos lhes propõem, a um preço irresistí­vel, autênticas máquinas de espiar, dando-lhes a crer que, utilizando-as, podem estar ‘mais próximos’ dos filhos”.
Considerando que, no domínio das imagens, a curiosidade dos pais pode enriquecer as relações com os filhos, o psiquiatra e psicanalista recomenda aos pais que se interessem um pouco menos por aquilo que os filhos fazem, o que sucede quando os tentam espiar, e um pouco mais por aquilo que eles pensam e sentem. Para isso, é necessário que os pais falem com os filhos sobre as imagens com que estes se vão confrontando.
O grande perigo da Internet, julga Serge Tisseron, consiste em levar as crianças a acreditarem que os seus interlocuto­res são, na realidade, tal como se lhes apresentam na rede. “É com esta ingenuidade que jogam os pedófilos que andam à pesca na rede. Por isso, não é interditando a utilização da Internet que se protege os jovens, mas aju­dando-os a compreenderem melhor as regras que a regem”.
Serge Tisseron considera que é necessário, desde logo, estabelecer o tempo que a criança pode encontrar-se perante o ecrã da televisão, da consola e do computador. Com três anos, esse tempo é mínimo: 45 minutos mais ou menos. Depois, vai aumentando aos poucos, até chegar a duas horas quando a criança tiver 8 anos. Uma regra defendida pelo psiquiatra e psicanalista estabelece que não deve haver televisão antes dos 3 anos, jogos digitais antes dos 6 anos, e Internet antes dos 9 anos. Outro bom princípio a respeitar é o de, às 23h00, se desligar a Internet. Uma outra recomendação essencial a reter é que importa explicar às crianças que, na Internet, nunca se divulgam quaisquer dados pessoais: nome, morada, telefone, palavras passe ou fotografias.

(1) Lisboa: Edições 70, 2007

fotografia: EJM

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