A coragem, o impacto e a independência são as três características da liberdade de imprensa que os Repórteres Sem Fronteiras distinguem no dia 8 de Dezembro em Taiwan. Para o secretário-geral da Organização Não-Governamental, Christophe Deloire, “o Prémio Repórteres Sem Fronteiras para a Liberdade de Imprensa tem como objetivo recompensar jornalistas que, pela sua coragem, pela sua independência ou pelo impacto das suas reportagens e investigações, assumem especialmente os ideais do jornalismo”. A distinção é uma homenagem e uma manifestação de “apoio claro e explícito a jornalistas que, com demasiada frequência, são presos, processados ou ameaçados precisamente por terem personificado esses valores”.
Para o Prémio de Coragem, há quatro jornalistas nomeados:
Elena Milachina, Rússia. É jornalista de investigação do tri-semanário Novaïa Gazeta. Ocupa o lugar de Anna Politkovskaïa, sua colega, assassinada em 2006. Alvo de ataques regulares, o mais recente em Fevereiro, num hotel em Grozny, e de ameaças de morte e de censura, Elena Milachina continua a publicar artigos sem concessões sobre as questões chechenas mais sensíveis.
Margarita “Ging-Ging“ Valle, Filipinas. É repórter do jornal e site Davao Today. Foi detida, presa e mantida incomunicável durante vários dias em Junho de 2019. Apesar da intimidação, nunca desistiu de denunciar violações dos direitos humanos no sudeste das Filipinas, que está sob lei marcial.
Fahad Shah, Caxemira, Índia. É o editor-chefe do The Kashmir Walla, principal media de investigação da Caxemira. Tem sido regularmente convocado pela polícia para interrogatórios – mal sucedidos – para o intimidar e ameaçar e para o obrigar a revelar as suas fontes. Fahad Shah também foi vítima de violência física.
Mohammad Masaed, Irão. Jornalista económico independente, foi reconhecido e premiado, designadamente com o Prémio Amin al-Zarb e o Prémio Deutsche Welle para a Liberdade de Expressão em 2020, pelas excepcionais investigações denunciando casos de corrupção económica no Irão.
Para o Prémio de Impacto, foram indicados duas rádios, um media de investigação e uma jornalista:
La Voix de Djibouti (LVD), Djibouti. É a primeira rádio livre da história de Djibouti. Banida do país, difunde as suas emissões a partir de França. Tem também uma edição escrita. La Voix de Djibouti trabalha com uma rede de jornalistas e colaboradores voluntários que fornecem informações. Trabalhando clandestinamente, é o único meio de comunicação livre produzido por djibutianos.
Disclose, França. É um media de investigação e uma Organização Não-Governamental sem fins lucrativos. Com financiamento exclusivamente assegurado por doações dos leitores, Disclose realiza investigações sobre temas de interesse público: meio ambiente, questões sociais, agro-alimentação, etc. O objectivo é estimular o debate público, oferecendo aos cidadãos a informação necessária para qualificar a intervenção cívica.
Radio Merman, Afeganistão. É a primeira emissora de rádio de Kandahar. Tem por objectivo servir a causa das mulheres do Afeganistão. Uma equipa de 15 mulheres jornalistas, produtoras e técnicas organiza, em colaboração com outras instituições, programas de combate à violência contra as mulheres. A rádio também oferece formação em jornalismo para mulheres. A estação opera apesar das ameaças dos talibãs, dos alertas da agência de segurança e dos ataques contra as suas jornalistas.
Cecília Olliveira, Brasil. É jornalista de investigação especialista em questões de segurança pública, drogas e administração pública na edição brasileira de The Intercept. Cecília Olliveira revelou o interesse económico de organizações internacionais na guerra de facções que assola o Rio de Janeiro, ao identificar a proveniência das balas recolhidas nos bairros assolados pelos conflitos. Umas eram tinham vindo dos Estados Unidos da América, da China, da Rússia e da Bélgica, outras apresentavam a marca da NATO. A jornalista também está na origem da plataforma Fogo Cruzado, que recenseia os actos de violência armada no Rio de Janeiro e no Recife e apresenta um banco de dados que contribui para o desenvolvimento de políticas de segurança pública.
Para o Prémio de Independência, foram nomeados dois jornalistas, uma plataforma de informações independente e um jornal
Lina Attalah, Egipto. Co-fundadora e editora-chefe do Mada Masr, um dos últimos sites de notícias independentes no Egito, a jornalista aborda assuntos delicados e luta contra a autocensura. Num país em que a maioria dos principais grupos de imprensa foi adquirida por pessoas próximas do presidente, Lina Attalah pagou por ser independente. Foi presa em várias ocasiões após investigações ou entrevistas e as instalações da sua redacção foram revistadas em 2019, após a publicação de uma investigação sobre o filho do presidente Abdel Fattah Al-Sisi. O acesso ao site do Mada Masr está bloqueado pelas autoridades egípcias. Lina Attalah está na lista das 100 pessoas mais influentes do mundo estabelecida pela Time Magazine em 2020.
Péter Uj, Hungria. Editor-chefe do site de notícias independente 444.hu, Péter Uj é uma figura emblemática do jornalismo independente húngaro. Em 1999, participou na criação do principal portal independente do país, Index.hu, cujo corpo editorial dirigiu por 11 anos, até o governo interferir na composição da equipe. Em 2013, lançou o site 444.hu, hoje uma dos raros espaços de liberdade de imprensa na Hungria, apesar das tentativas do primeiro-ministro Viktor Orbán de amordaçar os meios de comunicação independentes e após o desaparecimento virtual do Index.hu em Julho deste ano.
CamboJA, Cambodian Journalist Alliance, Camboja. A criação da Aliança Cambojana de Jornalistas, em Dezembro de 2019, nasceu de uma constatação avassaladora: o clã do primeiro ministro Hun Sen, no poder há 30 anos, conseguiu, antes das eleições de 2018 e com grande violência, aniquilar toda a imprensa independente e controlar o contexto mediático do país. CamboJA desenvolveu uma plataforma de informações independente que oferece aos jornalistas cambojanos um espaço de expressão, mas também de denúncia de violações à imprensa livre, assistência e formação em ética e investigação jornalística. Último bastião da independência dos meios de comunicação no país, possui mais de uma centena de membros.
La Prensa, Nicarágua. Fundada em 1926, tendo por lema “Estar a serviço da verdade e da justiça”, o mais importante diário do país não poupa críticas ao regime de Daniel Ortega. É, por isso, perseguido pelo governo. Desde há três anos, tudo tem sido feito para sufocar economicamente o jornal. Durante 18 meses, La Prensa foi vítima de uma escassez organizada de papel e matérias-primas, tendo sido obrigado a reduzir drasticamente a sua paginação. Mais recentemente, tem sido alvo de processos judiciais abusivos com o objetivo de fazê-lo pagar multas exorbitantes. O jornal explicou no editorial de 27 de janeiro de 2020, intitulado “A ditadura estrangula La Prensa”, que, devido a essa censura administrativa, a existência do jornal estava ameaçada.