Uma das memoráveis passagens de Os Maias, de Eça de Queirós, é a que, no capítulo IV, dá conta do andamento das obras do laboratório de Carlos da Maia: “Mas dentro os trabalhos arrastavam-se sem fim; sempre um vago martelar preguiçoso numa poeira alvadia; sempre as mesmas coifas de ferramentas jazendo nas mesmas camadas de aparas! Um carpinteiro esgrouviado e triste parecia estar ali, desde séculos, aplainando uma tábua eterna com uma fadiga langorosa; e no telhado os trabalhadores, que andavam alargando a clarabóia, não cessavam de assobiar, no sol de inverno, alguma lamúria de fado.”
O carpinteiro do século XIX é, no século XXI, o comentador televisivo de futebol; não tanto, evidentemente, pelo aspecto – o comentador não sendo propriamente um paradigma de telegenia, não é esgrouviado –, mas pela circunstância de parecer estar ali no ecrã, desde sempre, a aplainar banalidades eternas também com uma fadiga langorosa.
A monotonia do comentarismo futebolístico é um facto que o esbracejar e o gritar não são capazes de dissimular. A banalidade cansada, essa, tenta esconder-se sob um jargão emproado a tentar ser modernaço. A lista de exemplos estúpidos deste palavreado pretensioso usado nas televisões é longa, mas há um particularmente incómodo. É o “pré-match”, termo usado para intitular os chouriços que antecedem os jogos de futebol. “Pré-match” é também um pontapé na língua portuguesa.

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